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Jovens aliam estudo e amor para dar seguimento aos negócios da família em Bento

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O município de Bento Gonçalves é marcado por histórias singulares de centenas de famílias que trabalharam incansavelmente, por décadas, para garantir o sustento de seus filhos. Muitas dessas pessoas construíram seus patrimônios a partir da agricultura, da produção de vinho e do comércio. Apesar de serem poucos os negócios familiares que perduraram por longos anos, ainda é possível encontrar exemplos de sucessão familiar baseada nos valores repassados de geração para geração. São histórias de dedicação, união e amor pelo ofício dos pais e avós que tornam o negócio da família uma preciosa e querida herança.  

No campo


Vilma, Samara, Susana e Celso Strapazzon. Foto: Eduarda Bucco
 

As irmãs Susana e Samara Strapazzon auxiliam desde pequenas os pais Celso e Vilma com o cultivo e a venda de hortaliças, temperos e frutas. Há décadas, a família trabalha com agricultura no distrito de São Pedro, no Caminhos de Pedra, dando continuidade à cultura instaurada pelas gerações anteriores. “Sempre moramos aqui. Meus pais trabalhavam bastante com uva, mas por conta das intempéries e da queda de preço, meu pai começou a diversificar a plantação”, conta Celso Strapazzon. 

Ajudando no plantio e colheita desde pequeno, por volta dos 12 anos o agricultor iniciou a venda dos produtos na Feira do Produtor em Bento, acompanhado de seu tio. Foi vendo de perto o trabalho da família e colocando a mão na massa que Celso aprendeu a dar continuidade à plantação da família. “Na época não tinha internet. A irrigação era feita manualmente. Eu levava os produtos na feira de fusca”, recorda. “Comprei uma Kombi velha, depois um caminhãozinho e hoje temos um caminhão baú. Tudo foi conquistado com o apoio da família”, conta o agricultor.

Hoje, a plantação dos Strapazzon tem uma grande diversidade de culturas, indo desde o carro-chefe, a alface, até temperos, morangos e tomates. Junto ao irmão Luciano, Celso também cultiva videiras, preservadas pela família há gerações. 

E quem acompanhou toda essa evolução do plantio foram as irmãs Susana e Samara. O pai Celso conta que as filhas sempre fizeram companhia a eles durante o serviço, pegando gosto pelo ofício. “Quando começaram a entender um pouco sobre a produção, elas já estavam limpando temperinho, escolhendo e preparando tudo para a venda”, recorda. 

Não é a toa que, aos 22 e 17 anos, Susana e Samara já estão estudando para dar continuidade e trazer ainda mais qualidade ao trabalho dos pais. Susana está cursando Agronomia e Samara está fazendo o curso técnico em Meio Ambiente, ambas no Instituto Federal do Rio Grande do Sul (IFRS). “Eu comecei a ir à feira para vender os produtos com oito anos. Fazia as contas de cabeça e as pessoas gostavam”, recorda Susana. 


Foto: Eduarda Bucco
 

Aliando a teoria da faculdade com a prática em casa, Susana vem encontrando soluções para os eventuais problemas que surgem na plantação da família, além de implantar técnicas que têm apresentado resultados positivos. “Vemos na faculdade que é importante fazer rotação de culturas, mudanças de microrganismos e nutrientes. Aprendemos sobre doenças e tratamentos necessários com produtos microbiológicos, que são bem interessantes. [A produção agrícola] é muito abrangente. Depende de vários fatores. Então conseguimos aliar esse conhecimento com a nossa realidade”, comenta a estudante.

Incentivo às novas gerações

Susana e Samara contam que desde pequenas não pensaram em seguir outro ramo, principalmente por perceber que os pais precisavam de ajuda na plantação. E o incentivo dado pelo pai foi essencial para que as irmãs pegassem gosto pelo negócio familiar. “Nunca deixamos faltar nada a elas. Tudo que elas precisam está aqui”, revela. “Também sempre ensinei que nada cai do céu. É necessário dedicação. E graças a Deus hoje tenho duas parceiras. Isso para mim é muito importante e gratificante”, continua o pai.

Susana avalia que, além do prazer de trabalhar com a agricultura e de poder ajudar os pais, o ofício traz outros benefícios ligados à saúde e ao bem-estar. “A qualidade de vida no interior é melhor. Tu faz os teus próprios horários e está livre para deixar a máscara de lado agora na pandemia”, pontua. “E em Bento temos uma demanda muito grande. Tudo que tu plantar, tu vende. Se colocar uma placa em frente à nossa casa dizendo que vendemos verduras, alguém vai parar”, comenta a estudante. 


Foto: Eduarda Bucco
 

Atualmente a família comercializa seus produtos em restaurantes, mercados e na feira do produtor aos sábados pela manhã. O trabalho é diário e muitas vezes exaustivo, mas a gratificação de poder contribuir com uma alimentação saudável e saborosa compensa o esforço. “O cara que faz móveis, que fabrica o metal, o trator precisa ir para casa comer. Dentro do refeitório da empresa tem que ter uma comida boa para ele. E esse produto vem da agricultura familiar. Assim como eu preciso do produto que eles fabricam. Nós dependemos um do outro”, reflete Celso Strapazzon. “A agricultura familiar é muito importante para a qualidade de vida de toda sociedade”, complementa a filha Susana. 

E para as novas gerações, o agricultor deixa o recado: “Eu tive que aprender tentando. Cheguei a jogar plantações inteiras fora. Mas não desanimei. A juventude de hoje tem esse problema de achar que tudo vai dar certo na vida. É normal passar por dificuldades. O que não pode é desanimar. Depois de um temporal vem o sol”. 

No comércio


Foto: Eduarda Bucco
 

Aos 27 anos, o engenheiro civil Marcelo Helder Gehlen tem dedicado seus dias para dar seguimento ao negócio dos pais Marlene e Décio (em memória). Desde 2001, a família possui uma loja de materiais de construção no bairro Progresso, referência para os moradores daquela região da cidade. A empresa recebeu o nome de Bom Sucesso devido à antiga denominação do bairro e, desde então, tem mantido as boas características de um comércio antigo. “A gente sempre trabalhou aqui, então as pessoas nos conhecem. Temos muitos clientes antigos que nos dão força. E hoje em dia seus filhos também já estão comprando com nós”, conta Marcelo. 

O engenheiro civil começou a trabalhar na loja dos pais desde a adolescência, aprendendo sobre os produtos, as vendas e como se relacionar com a clientela. “Eles começaram pequeno. Era apenas uma casa de madeira e a equipe era formada pelos meus pais e meus tios, que iniciaram junto no negócio. Foi somente em 2009 que construímos o espaço que temos hoje”, recorda. Em 2011, os tios saíram do negócio e os pais Marlene e Décio apostaram na ajuda de Marcelo e de sua irmã para ajudar nas vendas. “Meus pais sempre trabalharam muito. Confiavam em todos e ajudavam os clientes da forma que podiam”, conta. 

Foi pensando em trazer ainda mais qualidade ao negócio dos pais que Marcelo decidiu iniciar os estudos voltados à área de engenharia civil. O filho permaneceu por dois anos afastado do trabalho para fazer estágio, mas logo retornou para dar continuidade ao serviço. Em 2019, após a morte do pai, Marcelo passou a se dedicar integralmente à loja. 

“Meus pais também não eram dessa área quando compraram a loja. Então nós aprendemos juntos, em família”, recorda Marcelo. “E hoje nós seguimos muito do que eles faziam e do que eles eram. Meus pais sempre foram exemplos de honestidade, confiança e integridade”, comenta. 

Agora, mesmo em meio às dificuldades advindas da pandemia, o engenheiro civil se mostra empenhado em dar sequência a tudo que seus pais construíram nas últimas décadas. “Queremos aprimorar, ampliar a gama de produtos e melhorar a gestão, já que sempre focamos bastante no operacional”, adianta. “Mas não pretendemos deixar de lado o que nossos pais fizeram. Apenas agregar o que aprendemos com nossas graduações e especializações. Vamos continuar mantendo aquela relação de proximidade com nossos clientes, os quais nos ajudaram a chegar até aqui”, finaliza. 

No enoturismo


Da esquerda para a direita: Loreno Cristofoli, Maria de Lourdes Cristofoli, Bruna Cristofoli, Lorenzo Cristofoli, Letícia Cristofoli, Roseli Cristofoli e Mário Luiz Cristofoli. Foto: Emerson Ribeiro
 

Os irmãos Bruna e Lorenzo, de 34 e 26 anos, e a prima Letícia Cristofoli, de 23 anos, cresceram em meio às videiras da família, no distrito de Faria Lemos. Foi apreciando o amor dos avós e dos pais pela produção de uva e fabricação de vinhos que os primos da quarta geração da família italiana no Brasil decidiram tornar a propriedade rural um verdadeiro diferencial no segmento do enoturismo. 

A história da vinícola teve início com os irmãos Loreno (pai de Bruna e Lorenzo) e Mario Luiz Cristofoli (pai de Letícia). Na década de 80, ao constatar dificuldades na venda de uvas, eles decidiram começar a produzir seu próprio vinho. O processo teve início informalmente no porão da casa dos avós. “No início eles vendiam em supermercados, bares e restaurantes. Depois começamos a ficar mais conhecidos por causa do enoturismo”, relata Bruna. 

A vinícola foi oficialmente fundada em 1998 e hoje elabora vinhos finos, vinhos de mesa, espumantes, graspa e suco de uva. Além disso, oferece opções gastronômicas e turísticas, com almoço ao ar livre, passeio de trator e colheita e pisa de uva.

No comando da empresa, os dois proprietários e irmãos contam com o auxílio dos filhos enólogos na área da gestão. “A gente optou por trabalhar na vinícola por ter crescido aqui. Fomos crescendo junto com a empresa e aqui encontramos áreas onde conseguimos colocar nossas habilidades em prática”, revela Bruna. 


Bruna, Letícia e Lorenzo Cristofoli. Foto: Emerson Ribeiro

Mas, além do amor pelo negócio, a enóloga destaca o apoio da família como essencial para garantir a permanência dos jovens no negócio. “Muitas vezes os pais não incentivam os filhos quando falam mal do seu trabalho, quando não dão espaço para eles trabalharem e darem opiniões. Alguns produtores ficam fechados em sua propriedade rural e não conseguem se abrir para as oportunidades. Então os filhos não veem perspectiva”, analisa Bruna.

Na visão da enóloga, atualmente as propriedades rurais precisam encontrar um equilíbrio entre o passado, o presente e o futuro. “É preciso dar mais espaço aos jovens, profissionalizar processos e buscar oportunidades, porque está cada vez mais difícil viver somente da uva. Então você tem que encontrar meios de agregar valor à sua produção para que os jovens tenham interesse”, aconselha. “Além disso, é importante estudar para tocar a propriedade como um negócio profissional, abrindo os horizontes”, complementa. 

Aliando a história da família, com o conhecimento obtido por meio dos estudos, especializações e novas visões do mundo atual, os primos pretendem alavancar ainda mais o negócio nos próximos anos. “Temos esse diferencial da mistura do vinho e do enoturismo, da cultura familiar e da visão atual e moderna”, comenta. “E hoje a vinícola para mim é o sonho do meu futuro. Ver ela crescer e prosperar é uma forma de deixar vivo o legado da nossa família”, finaliza.