O limbo entre insistir e desistir

Impossível não notar esse tanto de pessoas com medo da mu­dança, que na angústia de viverem mais do mesmo acabam por alimentar a ansiedade de um sabe-se lá o que. Relacionamentos que estão dando errado há mais tempo do que deram certo. Em­pregos que fazem o acordar de todas as manhãs uma luta. Surtos de ansiedade inexplicável.

É a queixa que mais recebo: “Felipe, não estou feliz, quero sair disso, mas não consigo. O que faço?”. Mas pouco do que eu diga trará realmente uma luz. No fundo nós sabemos de nossos limites, sabemos quanto podemos insistir até o momento que explodimos e desistimos. Algumas pessoas levam mais tempo do que outras, mas todos nós temos nosso tempo-limite antes de dizer chega.

Insistimos porque amamos ou por termos medo de morrer sós? Insistimos porque ainda acreditamos no que fazemos ou por acharmos que não sabemos fazer outra coisa? Quantas vezes nos pegamos mentindo a nós mesmos, tentando nos convencer de que aquele problema de anos um dia simplesmente desaparecerá?

Eu admiro quem tenta, quem insiste, quem se esforça ver­dadeiramente mesmo na adversidade, mas até quando faz bem carregarmos o cadáver daquilo que só nós não notamos estar em cacos? Ah essa mudança, que atormenta, que nos faz virar a noite acordados imaginando tudo de pior que poderá ocorrer. De onde vem esse terrível medo de mudar aquilo que tão mal já nos faz?

Ver de fora parece tão simples. Duas amigas tomando café e dividindo seus sentimentos na busca de uma luz que nunca surge. Ouvimos o problema do outro e sem perceber buscamos uma fagulha que resolva os nossos próprios dilemas. Mas quem vivencia mergulha e quem mergulha logo sufoca deixando de ver com clareza.

Aristóteles dizia que a coragem é a mãe de todas as virtudes. Talvez todos nós lá no fundo saibamos disso, e é justamente por sabermos do fundamental da coragem que a angústia de não a termos seja tão dilacerante. “Eu sei que passou da hora de tomar essa decisão, mas não posso tomá-la agora.” E lá estamos nós, agora sufocamos também junto ao tempo que sentimos perder.

Se o que construímos nos dá a identidade, se nossos laços des­crevem quem somos, como podemos deixar isso para trás? Quem eu serei quando tirar de minha vida aquilo que me sustentava? Todos esses medos parecem tão próprios, tão únicos. Faz parte de nossa mentira existencial, nos julgamos seres únicos, mas o preço de ser único é que a dor não pode ser comparada ou dissolvida.

Mesmos problemas que só mudam de endereço. Se já fomos especiais em nossas qualidades hoje somos em nossa dor. Fize­mos de nosso sofrer o protagonista e hoje temos a sensação de que ninguém mais nos entende.