Possível estadualização de trecho da BR-470 gera mobilização na Serra Gaúcha

Líderes de entidades, prefeitos e vereadores da Serra Gaúcha têm se mobilizado para evitar a estadualização de 13km da BR-470 e ainda ampliar as discussões sobre o tema. O projeto de lei que autoriza o governo do Estado a receber do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transporte (DNIT) o trecho com início no entroncamento da ERS-444, entrada do Vale dos Vinhedos, e fim no entroncamento com a ERS-446, em Carlos Barbosa, mais precisamente entre os km 219,1 e 232,1, já foi aprovado pela Assembleia Legislativa. A proposta faz parte do Plano de Concessão das Rodovias do governo do Estado, que necessita da área para implantar um pedágio em Carlos Barbosa.

O projeto de estadualização desse trecho contempla, em até quatro anos, a duplicação dos 13km, principal demanda dos motoristas que circulam na rodovia. No entanto, líderes apontam um retrocesso estadualizar a via, depois de longos anos em busca e da conquista da federalização. Além disso, apontam imprecisões no projeto e também insegurança de que o plano de investimentos seja realmente cumprido pela concessionária. 

Embora ainda possa ser discutida, a proposta do governo, além da duplicação em até quatro anos do trecho entre Bento e Barbosa, prevê que até o quinto ano de contrato a concessionária deverá concluir a duplicação da ERS-122, entre Farroupilha e São Vendelino, e no contorno norte de Caxias do Sul, além da RSC-453, entre Farroupilha e Bento Gonçalves. A RSC-453 também deve ganhar terceira faixa entre a rótula de Caravaggio e a saída para Porto Alegre, em Farroupilha. 


Até o 10º ano de contrato, a ERS-446, entre Carlos Barbosa e São Vendelino, também precisa estar totalmente duplicada, bem como a ERS-235, entre Nova Petrópolis e Gramado. Nos 20 anos seguintes, a concessionária precisará implantar terceira faixa entre Caxias do Sul e Farroupilha e também na BR-470, entre Bento Gonçalves e Garibaldi.

As estradas da região também devem ganhar 12 passarelas. Os investimentos, que serão obrigatórios e previstos no contrato, não impedem que a concessionária realize outros investimentos cuja necessidade seja identificada ao longo do tempo.

Embora saibam das necessidades destes investimentos na rodovia da região, prefeituras e entidades temem o não cumprimento do contrato e outros pontos importantes que não foram incluídos no plano. Pensando nisso, um ofício assinado pela Associação das Entidades Representativas de Classe Empresarial Gaúcha (CIC Serra), pela Associação dos Municípios da Encosta Superior do Nordeste (Amesne) e pelo Consórcio Intermunicipal de Desenvolvimento Sustentável da Serra Gaúcha (Cisga), destinado ao secretário Extraordinário de Parcerias do Estado do Rio Grande do Sul, Leonardo Busatto, aponta os principais pontos de divergências encontrados no projeto do governo do Estado e solicitam “um novo e atencioso olhar por parte da pasta, a fim de que seja possível articular, por meio do diálogo, brevemente a implantação do Programa no Estado”.


 

Análise de obras
O primeiro ponto reivindicado é um prazo maior para a análise de obras. De acordo com o documento, as proposições de obras e interseções apresentadas para os trechos do Programa de Concessão de Rodovias Estaduais foram efetuadas de forma unilateral por uma empresa contratada, sem qualquer diálogo com as prefeituras dos municípios ligados por essas estradas ou das comunidades circunvizinhas. “O resultado é um estudo desconexo da realidade – e das necessidades – dessas cidades e sua população. Existem Obras de Arte, como rótulas alongadas, sugeridas para trechos onde é sabidamente existente o pleito por viadutos – para citar um entre tantos exemplos”, aponta o documento. O pedido das entidades é para que seja concedido prazo extra – de seis meses – para que seja travado diálogo entre as prefeituras adequando o projeto “de forma mais eficiente às demandas dos municípios e dos usuários rodoviários”.

Outorga
Outro ponto contestado pelas entidades é a modelagem que contempla o sistema de outorga. Conforme a proposta apresentada inicialmente, o primeiro critério para definir o vencedor do leilão será quem oferecer a tarifa mais barata, com deságio limitado a 25% do valor inicial.
Se houver empate, ganha a empresa que oferecer a maior outorga ao governo. De acordo com o governo, os recursos obtidos com a concessão deverão ser investidos nos mais de 9 mil quilômetros de rodovias que continuarão sob administração do Estado.  “Entendemos que ele compromete o fluxo de caixa e, consequentemente, a aplicação de investimentos por parte da empresa vencedora do certame”, pontua. O ofício ainda critica o formato em que se apresenta a outorga, pois permite que recursos advindos de uma região que aceitou a concessão das rodovias e seu pedagiamento possam ser utilizados para manutenção de trechos cujas comunidades não aceitaram o formato de concessão e tampouco são contribuintes com o pedagiamento. “É injusta e desigual”, afirma a nota.


Limite de deságio tarifário
No Programa de Concessão de Rodovias Estaduais, o governo propõe o travamento em 25% no limite de deságio tarifário (redução da tarifa em relação ao teto estabelecido). As entidades são contrárias e recomendam que o Deságio Tarifário seja livre ou então limitado a até 60% de desconto. “Com esse percentual será possível estabelecer uma tarifa de pedágio percebida como justa e adequada pela população, coerente com o montante de obras e melhorias às quais dizem respeito”, pontua.

Outra questão apontada pelas entidades é em relação ao DUF (desconto para usuário frequente). Elas reivindicam passagem livre após dez usos contínuos mensais feitos pelo usuário no ponto de pedágio. “Os usuários frequentes, contemplados por esse benefício, correspondem a uma fração mínima do montante do volume diário médio (VDM) de tráfego nas rodovias, ou seja, é um ajuste que não compromete a viabilidade financeira ou rentabilidade das operações”, argumenta.

O Relatório de Análise do Programa de Concessão de Rodovias Estaduais também sugere que seja estabelecido o início da cobrança das tarifas somente após a apresentação de, pelo menos, 20% das obras propostas para o trecho, justificando, assim, o início do ônus para o usuário – que já estará fazendo proveito das melhorias aplicadas na rodovia. 

As entidades também solicitam revisão do documento contratual a ser firmado com as empresas operadoras, e sugerem o tempo máximo de 25 anos. Ainda no que tange à documentação contratual, líderes recomendam um dispositivo legal prevendo que, em caso de não cumprimento dos prazos para entrega das obras estabelecidos em contrato, seja imediatamente interrompida a cobrança do pedágio na região. 


GOVERNO FEDERAL
Além de enviar o documento para a análise do Programa ao Estado, as entidades têm se mobilizado na esfera federal para tentar evitar a estadualização. De acordo com o presidente do CIC Serra, Elton Gialdi, a ideia é tentar obter, via Ministério de Infraestrutura e Dnit, um compromisso de investimentos nas rodovias da Serra e, com isso, evitar a estadualização do trecho. “Se por um lado temos um contrato que prevê em quatro anos a duplicação deste trecho por meio da estadualização, por outro existe uma insegurança que essas obras sejam realmente feitas. Além disso, a federalização da 470 trouxe inúmeros benefícios para a Serra Gaúcha. Não queremos perder isso”, pontua Gialdi. “Estamos tratando sobre esses temas pensando em toda nossa potencialidade industrial e turística. Vamos tentar um compromisso com o governo federal para viabilizar estas obras, que são tão importantes para a região, dentro de um prazo parecido com o plano do Estado”, completou.

As entidades também cobram a apresentação de um documento comprovando, de fato, que a União repassou o trecho para o estado, o que até agora não foi divulgado pelo governo. “Todas essas mudanças estão muito confusas para todos nós, pois não há diálogo com os municípios. Depois de federalização nossa rodovia melhorou muito e, por isso, nosso sentimento é que se pudessem fazer esses investimentos via Dnit. Alguns técnicos e secretário do governo do Estado analisaram a proposta de concessão e entenderam que para ser feito isso teria que fazer uma estadualização. Agora o que sentimos é que tudo está sendo feito no atropelo, uma questão que é de extrema importância para a Serra. O grande problema é a falta de confiança no processo. Se tivéssemos a certeza que a concessionária cumpriria os prazos, o entendimento seria diferente”, conclui.