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Quatro décadas de grandes desafios, histórias marcantes e valiosas amizades

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Aos 72 anos, o motorista José Plizzari não poupa palavras para falar com carinho da profissão que escolheu há cerca de quatro décadas. Natural de Garibaldi, mas morador de Bento Gonçalves desde 1972, Plizzari conta que, quando jovem, trabalhou como empregado no plantio e colheita de uva no interior. Mais tarde, ajudou a construir a antiga pista artificial de esqui em Garibaldi. Trabalhou em uma vinícola, em uma metalúrgica, em uma fábrica de pólvora, em uma transportadora como ajudante de carga e, depois, como conferente. Mas foi em 1981, após tirar a carteira, que seu José descobriu seu verdadeiro ofício: a de motorista. “É uma profissão muito prazerosa. Tu conversa com muita gente, escuta histórias curiosas, descobre coisas novas e conhece muitos lugares”, descreve.


 

José começou atuando como motorista no perímetro urbano, levando com segurança os funcionários de uma empresa de móveis para suas casas. Depois, foi contratado por uma transportadora para fazer entregas em todo o Rio Grande do Sul e em Santa Catarina. “Nessa época fui duas vezes a São Paulo sozinho, sem saber o caminho”, recorda. Por volta do ano de 1992, Plizzari decidiu se aventurar no trabalho de motorista de ônibus, fazendo o horário das 16h à meia-noite. Mas era nas estradas que José sentia o amor pela profissão. “Então fui trabalhar com um amigo em uma transportadora. Fazia duas viagens por semana a Curitiba. Depois que a empresa fechou, continuei trabalhando com o caminhão dele, fazendo o norte do Paraná”, conta. 

Foi então que os verdadeiros desafios do ofício começaram a fazer parte de sua rotina de trabalho. Em uma de suas viagens, após levar uma carga de café, ficou dez dias parado esperando uma nova carga para voltar para casa. “Consegui uma de farinha de milho para voltar, mas quando cheguei, fiz as contas e percebi que não tinha sobrado dinheiro da viagem. Não deu sequer para pagar as despesas, porque o valor do frete do produto era muito baixo”, recorda o motorista. 


Primeiro caminhão de seu José. Foto: arquivo pessoal
 

Com alguns prejuízos constatados ao trabalhar como empregado, seu José decidiu, mais tarde, comprar seu primeiro caminhão e começar a atuar por conta própria. Desde então foram três veículos, um deles furtado em Bento, até chegar ao caminhão que tem hoje, um Volkswagen 9-150. 

O passado e o presente

Foram anos de longas distâncias em estradas de chão, com pouca ou nenhuma sinalização e sem qualquer meio de comunicação com a família. Nas noites, José conta que costumava ligar de um orelhão para a então esposa Marilena Mattuela Plizzari (em memória) para dar notícias e matar a saudade. 

Em uma de suas viagens, a ligação foi de desabafo e alívio após seu José quase se envolver em um grave acidente na região do município de Cerro Grande do Sul. No local, a estrada principal estava sendo asfaltada, sendo necessário passar por um desvio para completar o trajeto necessário. Entretanto, aquela estrada estava em péssimas condições, contornando, sem qualquer segurança, um peral de cerca de 100 metros de altura. “Um caminhoneiro foi junto comigo e passou na frente. Mas o caminhão dele era curtinho e foi tudo bem. Na hora de eu passar, olhei para baixo e vi o peral. Me arrepiei”, recorda. Além das péssimas condições da via, na parte de cima os tratores trabalhavam com o asfaltamento da estrada principal, jogando pedras para baixo. “O caminhoneiro que foi na frente me falou: ‘quando os tratores voltarem, tu passa’. Se não as pedras iriam me derrubar para baixo”, conta José. Mesmo seguindo todas as recomendações e tomando os cuidados necessários, em uma curva o caminhão escorregou e quase caiu no barranco. “Aquela noite eu não dormi. Falei que nunca mais iria andar em desvios”, continua. 


 

Apesar dos perrengues e das melhores condições de trafegabilidade das estradas do país nos dias atuais, José Plizzari não pensa duas vezes ao afirmar que, no passado, a profissão de motorista era mais segura e prazerosa. “Não se tinha horário para chegar ao ponto de entrega das cargas. A gente parava nos postos e dormia com as portas abertas”, comenta José. 

Com o passar dos anos, o motorista analisa que foi possível notar mudanças significativas na profissão, com roubos de carga recorrentes, pressão por parte das empresas para redução no tempo de viagem e aumento no preço dos combustíveis. 

Em uma de suas viagens, em Lagoa Vermelha, José conta que foi surpreendido por uma quadrilha de roubo de carga. Ele havia parado em uma lanchonete e, quando voltou ao caminhão, foi enclausurado por quatro criminosos. “Um deles estava do lado da porta do caroneiro, um do meu lado e dois na frente. Então liguei o caminhão e sai em cima deles. Entrei na pista e parei no posto da polícia”, relata o motorista. Naquela ocasião, José precisou passar a noite junto à polícia. “Uns três meses depois eu estava em Santa Maria conversando com um motorista de Lagoa Vermelha e ele me falou que o dono da lanchonete já havia mandado matar algumas pessoas para roubar a carga”, conta José. “Hoje, se paro num posto que não tem ninguém, eu não fico. A gente tem que levar choque para aprender”, diz.


 

Atualmente, José faz somente viagens a Porto Alegre, transportando peças de máquinas. Mesmo assim, ele continua constatando as dificuldades dos colegas que precisam lidar com a insegurança e com o cumprimento de horários. “Naquele tempo se estacionava em qualquer posto. Não pagava banho. Comia e dormia tranquilo. Hoje tu precisa pagar pelo banho, em uma estrutura precária, e ainda não dorme tranquilo porque está sujeito a ser assaltado a qualquer momento. Qual a segurança do brasileiro hoje? E ainda se sujeitando ao uso de drogas para conseguir cumprir horário, porque se não cumprir, é descontado na porcentagem do frete”, expõe. 

Prestes a se aposentar da profissão, mas ainda apaixonado pelo serviço, José continua a reflexão sobre a situação atual dos caminhoneiros, principalmente após a pandemia do Coronavírus. “Ninguém falou dos caminhoneiros durante a pandemia. Se fecharam postos, borracharias, restaurantes, e os caminhoneiros não pararam. Foram verdadeiros guerreiros”, analisa. 

Em homenagem ao Dia do Colono e do Motorista, celebrado no domingo, 25/07, José Plizzari encerra sua fala com um recado a todos os brasileiros: “Os caminhoneiros estão sempre prontos a ajudar quem precise. É um grupo bem unido. É uma profissão que te dá prazer, que te faz aprender muito. Mas as condições do nosso país não são boas. Tem tantos deputados e senadores, será que não tem um que possa pensar pela categoria? Que possa lutar por condições melhores para os caminhoneiros? Se todos soubessem as situações, os perrengues que se passa nas estradas, com certeza dariam mais atenção”, finaliza.

Fotos: arquivo pessoal